Amada por muitas, odiada por alguns, a Lei Maria da Penha nasce para proteger a mulher de violência doméstica e familiar contra agressões e diversas outras formas de violência.
Neste artigo, o advogado criminalista e direito de família, Lunay Costa, irá explicar um pouco mais sobre esta lei, trazendo fortes reflexões sobre seus benefícios, riscos de mau uso e apontamento de novos caminhos para a Lei.
A Lei Maria da Penha
O que pouca gente sabe é que a Lei Maria da Penha praticamente não cria crimes, salvo o de Quebra de Medida Protetiva, previsto no artigo 24-A da lei 11.340/2006. Logo, se ela não cria crimes, então o que ela cria?
A Lei Maria da Penha cria um conjunto de regras e contextos que irão procurar assegurar maior proteção à mulher que alegue sofrer violência doméstica e familiar, criando mecanismos jurídicos para acelerar a concessão de medidas protetivas de urgência, assegurar tratamento em tese humanizado em delegacias e unidades do judiciário, além de prever diversas formas de violência, dentre elas psicológica, patrimonial e até moral.
A grande questão é que exatamente por esta lei não criar crimes, ela irá se aproveitar dos crimes já previstos no Código Penal brasileiro e outras leis criminais para as colocar no contexto de proteção à mulher.
Apenas como exemplo, todo mundo pode sofrer uma lesão corporal de natureza leve, tanto homens como mulheres. Oras, é esta lesão corporal, quando intencional e dolosa em contextos que não sejam o de violência doméstica e familiar contra a mulher precisam de uma autorização especial da vítima para que se abra um Inquérito Policial, mas, como dito, isto não acontece na Lei Maria da Penha.
Portanto, uma mesma conduta criminosa quando feita exclusivamente dentro da violência doméstica e familiar contra a mulher terá o amparo da Lei Maria da Penha.
Hoje em dia, há muitos “especialistas” na internet, mas redes sociais, nos vídeos curtos e nos grupos de mulheres e homens explicando que há vários crimes tais quais a violência patrimonial, a violência moral e tantas outros, criou-se até o termo “estelionato sentimental” e se tenta colocar tudo isso dentro da Lei Maria da Penha como se ela criasse crimes. Bem, ela não cria.
O risco está exatamente nessa avalanche de equívocos sobre a Lei Maria da Penha e sobre o Direito Penal
Pequena consideração sobre Direito Penal
Por mais bem intencionados que muitos sejam, isso não muda o fato de que a matéria penal não é tão simples quanto se pretendem explicar via internet. Assim, o que irei fazer aqui é apenas pontuar alguns elementos que você precisa saber para que exista de fato um crime em linhas gerais.
Oras, em primeiro lugar, é preciso existir uma lei que defina uma atitude humana como crime. E mais, essa lei precisa existir antes que a atitude criminosa ocorra. Logo, se não há uma lei que defina claramente que uma conduta humana é crime antes de ele ocorrer, não se pode sequer pensar em avaliar se houve ou não crime, pois não.
Depois disto, é preciso verificar quem sofreu, quem agrediu, qual o sexo de cada um, se havia ou não relação de afeto entre eles ou elas, se foi intencional ou não, se a pessoa estava em legítima de defesa ou outra excludente de crime. Enfim, perceba que existem muitas nuances que precisam ser avaliadas antes de dizer que algo é o não crime. Portanto, ir à internet ou grupos de whatsapp dizendo que algo é crime sem o ser é no mínimo criar expectativas que podem ser falsas.
O tratamento humanizado necessário
Quem se achega a uma delegacia para se queixar de um suposto agressor, quando real, está em um estado pós-traumático, emocionada, com pensamentos confusos, temores, às vezes uma desconexão de sentimentos, mistura de raiva e medo.
Oras, não podemos esperar que alguém neste estado seja capaz de contar uma história com elementos exclusivos que caracterizem um crime, é preciso paciência, tranquilidade e técnica para extrair a história de forma que seja juridicamente relevante para o aspecto criminal no intuito de saber se houve ou não um crime.
É nesta hora que a simples formação típica de delegacia se torna insuficiente, pois irá precisar mais de conhecimento de abordagem psicológica, de assistência social e de acolhimento do que a fria técnica jurídica. O filtro precisa ser aplicado com carinho, respeito e responsabilidade.
Necessidade de Filtro
A abordagem policial para extrair os fatos juridicamente relevantes precisa identificar se ali há uma vítima de violência doméstica ou uma agressora de falsa comunicação de crime na tentativa de realizar uma denunciação caluniosa com intuito de vingança.
Vítimas precisam de acolhimento, criminosos de processo e julgamento. E também é crime fazer uma falsa comunicação de crime. É tentar usar o judiciário como arma de vingança pessoal contra um homem. É retirar a vaga de uma mulher verdadeiramente vítima de violência doméstica de receber todo o acolhimento e proteção jurídica.
O estado precisa filtrar quem é quem.
Minhas conclusões práticas são
A Lei Maria da Penha representa um excelente avanço na proteção da mulher vítima de violência doméstica, mas também precisa ser melhor explicada à população e não deve ser apropriada por grupos militantes que a usam como bandeira política, ideológica de uns contra os outros. Ela deve proteger a mulher de agressões, mas também de responsabilizar inclusive outras mulheres que falsamente acusam homens, pois não é apenas o homem que é vitima dessa violência doméstica, mas sim outras mulheres e o estado.